"UM CONSTANTE DESENTENDIMENTO"

Dois dos melhores seniores nacionais não foram convocados para o recente Europeu e, na altura do estágio terminal, o NdR quis saber os motivos. Bruno Amorim e Roberto Rodrigues pediram um período de reflexão e, "para bem do remo português", responderam a uma entrevista onde confessam a existência de desentendimentos entre os atletas e a equipa técnica nacional.

O Campeonato da Europa foi entre os dias 18 e 21 e uma das tripulações nacionais que melhor figura fez na regata de apuramento não foi sequer convocada para estágio. Por que ficaram de fora?
Bruno Amorim (BA) – Na verdade, nem fomos informados que ficávamos de fora. Esperámos por uma convocatória que demorava a chegar e só depois, quando tentei falar com o treinador que estava no comando das equipas que participariam no Europeu, é que me avisou que encaminharia o meu email para o director técnico. Este, mais tarde, respondeu-me com uma carta bastante ofensiva, dizendo que eu não representaria mais Portugal enquanto não alterasse certos comportamentos, como é descrito por ele: alterar afinações dos barcos (sempre com a sua permissão), alteração de treinos (de novo com o seu consentimento), entre outras muitas que, na verdade, eram responsabilidade dele próprio. Neste caso, não tinha quaisquer controlos nem conhecimentos dos nossos valores físicos, afinações e mesmo de quem eram os nossos adversários e, inclusive, não sabendo observar o barco em que nos remávamos, o qual não era para o nosso peso.

Surpreendeu-vos não serem opção para o Europeu depois de terem representado Portugal na tentativa de apuramento olímpico?
Roberto Rodrigues (RR) – Sinceramente, não esperava isto desta forma. Eu e o Bruno sempre trabalhámos de forma afincada durante os três últimos anos, com um objectivo muito concreto. Passámos por bastantes dificuldades, tanto pessoais como desportivas, mas sempre tivemos níveis de motivação altos para continuar a trabalhar forte. No entanto, com o passar dos meses, os níveis de paciência não são iguais e, em meados de Fevereiro deste ano, tentámos fazer ver ao DTN que as coisas não podiam ser tão lineares como ele pensava.
Foi aí que começamos a ver a indiferença dele para com o nosso trabalho de anos. Tinham resolvido acabar com o «4-» sem uma justificação válida, acusando o nosso colega Júlio do sucedido e de cobardia por este estar com problemas familiares, que resultavam do incumprimento das responsabilidades da Federação a tempo e horas. Ele apenas manifestou que não estava a conseguir treinar o que desejava e a atitude ingrata dos responsáveis foi dispensá-lo no momento.
A alternativa foi começar o «2-» entre nós os dois, no entanto, não havia barco, não havia material, o DTN não tinha conhecimento das equipas que existiam e do tipo de trabalho que tinha que ser feito para o apuramento. Demonstrámos o nosso desagrado em relação a isto e, sobretudo, com o plano de treinos completamente descabido das nossas necessidades. A partir desse momento, o comportamento foi no sentido de nos desmotivar, de arranjar conflitos, incentivando-nos directamente a desistir e a abandonar a alta competição. Após o sucedido, ficamos à espera de tudo e já nada nos surpreendeu…
BA – Hoje, dia 8 de Setembro, li um documento da Federação que criticava e penalizava os atletas Sub-23 que abandonaram o estágio em Agosto, no qual dizia que agora Portugal, candidato a organizar um Europeu, agora sem representação, estava numa situação mais difícil. Neste momento, eu penso que se realmente estivessem interessados em transmitir boa imagem em regatas internacionais, não deveriam estar constantemente a expulsar e dispensar atletas, visto que a continuidade é muito importante. Actualmente, vê-se o resultando da brilhante gestão que o DTN tem feito, que não tem atletas para participar.

São os dois «sobreviventes» do antigo «4-», mas foram à regata de apuramento em «2-». Foi uma aposta vossa ou ideia da equipa técnica?
Foi o nosso único recurso para não abandonar todo o trabalho que realizamos nestes três anos. Em 07/08, houve novas dificuldades, que a Federação não esteve empenhada em tentar resolver, mas sim em simplesmente descartá-las, ou seja, acabou-se com o «4-». Portanto, o «2-» foi a nossa única opção.

Sendo dos mais experientes do último lote de seleccionados, como encararam o facto de não vos terem sequer explicado a não ida ao Europeu?
RR – Depois de três anos a trabalhar com aquela equipa técnica, já os ficamos a conhecer um pouco, assim como a forma como trabalham. O mais importante para eles não são os resultados reais, mas sim libertarem-se de responsabilidades do mau trabalho que é feito diariamente. Bom exemplo disso foi o que aconteceu no Europeu do ano passado, em que, para começar, nos mandaram trabalhar para o Pocinho em pleno Verão sem treinador, enquanto o DTN passava férias. O nosso barco teve um acidente enquanto eles o transportavam na viagem para o estágio, do qual resultou uma das bordas partida. Avisámos logo de imediato que o barco não estava em condições, mas ninguém quis saber. Até que, depois de tanto avisar, o barco partiu por completo uma das cavernas, durante a eliminatória da prova. O presidente conseguiu arranjar um barco emprestado, mas que nem casco de quatro sem era, não tinha as mesmas condições e ao qual não estávamos minimamente habituados. No entanto, no final da regata em que não tínhamos conseguido entrar na final A por décimos de segundo, tiveram uma discussão connosco, dizendo que éramos os culpados pelo o resultado não ser o que pretendíamos. Como se nota, a falta de profissionalismos deles leva a que se comportem desta maneira. Devo referir também que já há um mês mandei um email ao DTN a perguntar as razões da não convocatória e, até ao momento, não obtive qualquer tipo de resposta.
BA – Para mim, não foi surpresa, porque quem já esteve no Pocinho ou passou pela Selecção sabe que, ao trabalhar com estas pessoas, todos os dias é a verdadeira incerteza. Nunca se sabe ao certo qual a verdadeira intenção da equipa técnica (tanto tínhamos «treinador», como passávamos dias sozinhos). Planos de treino feitos em duas horas, que depois ninguém conseguia perceber ou chegava-se à conclusão que era igual para todos! Neste contexto, decidir não nos convocar ou avisar, para mim, é normal e completamente ao nível desta equipa técnica.

A meia-final na regata de apuramento, feita com um ano de preparação em conjunto, demonstrou que o «2-» até podia ter algum potencial. Agora que foram postos de lado na equipa portuguesa, vão insistir no trabalho em conjunto ou, até por serem de equipas diferentes, vão pensar em novos desafios?
RR – Pessoalmente, estou num período de reflexão. O último ciclo olímpico foi bastante desgastante, não só nos termos físicos, mas sobretudo por trabalharmos quase sempre na incerteza do nosso futuro. As condições sempre foram precárias para realizarmos um trabalho que nos desse o apuramento para os Jogos: os treinadores deslocados da realidade do remo internacional e sem saber que tipo de trabalho fazer para atingirmos as performances pretendidas, os dirigentes a pensar que nos estão a fazer um grande favor por remarmos no Pocinho…
No entanto, confesso que tenho ainda o objectivo de participar nuns Jogos, de ter valor competitivo para andar com os melhores lado a lado e até de participar no Campeonato da Europa que vai ser em Portugal. Mas isso não pode ser com pessoas que desvalorizam e ignoram os atletas, usando-os para encobrir o mau trabalho, como técnicos e como dirigentes. Um caso disto foi o que fizeram a muitos atletas há bem pouco tempo, que foram multados, segundo a Federação, por não usarem correctamente o equipamento da mesma. Fui um deles, fui multado em todas as regatas que participei e, inclusive, no Campeonato do Mundo de Sub-23, prova a que não fui por já ser sénior A. Tudo isto são situações que não podem acontecer nem nos clubes, quanto mais numa Selecção Nacional, e são situações que cansam muito os atletas e que nos fazem duvidar se vale a pena continuar a investir. Os atletas precisam de alguém em quem possam acreditar, não pessoas que os usem, por isso não sei como vai ser o futuro.

Para o estágio terminal foram chamados 12 atletas. Ao que apurámos, quatro comunicaram logo que não iam, os oito restantes deixaram o estágio ao segundo dia, dando a entender haver problemas com os treinadores. Há ou não problemas entre atletas e a equipa técnica nacional?
BA – A verdade é mesmo triste, mas é mesmo essa, existe um constante desentendimento entre atletas e treinadores e, na minha opinião, não é culpa dos remadores, porque já todos os atletas de qualidade que existem em Portugal passaram por lá e acabaram por desistir! Eu, que também passei por isso, desde o início senti que os treinadores tratavam os atletas como rivais ou pessoas conflituosas, que tinham que conquistar para todos terem o seu lugar cativo na equipa nacional. O caso mais grave que eu presenciei, enquanto estava no «2-» com o Roberto, foi o seguinte: o nosso treinador da altura falava connosco e a um dizia que o outro era mau remador, que não tinha valor; ao outro dizia que «o teu companheiro está muito mal da cabeça e é por isso que o barco não anda!» Eu gostava de algum dia perceber como é que uma pessoa profissional se preocupa mais em separar dois atletas e em criar atritos entre eles em vez de tentar perceber o verdadeiro problema. Para nosso bem, eu e o Roberto sempre estivemos unidos e conseguimos ultrapassar essas atitudes e até esquivar muitas outras com que tentaram atingir-nos.

Na última Olimpíada (período de tempo entre cada Jogos), diversos atletas foram afastados da Selecção, casos da Sara Silva, Ricardo Santos, Ricardo Paula, Carlos Bairrão e Paulo Quesado, entre outros. Têm algum receio de serem os primeiros excluídos neste ciclo para Londres 2012?
BA – A decisão de continuar a trabalhar ao mais alto nível, ou não, depende de nós! Agora, se somos ou não excluídos no próximo ciclo, já não! Mantenho-me de consciência tranquila, porque sei que eu e as equipas que integrei sempre nos transcendemos para dignificar o Portugal, mesmo com condições treino tão complicadas.
Espero é que o trabalho do Nuno e do Pedro seja reconhecido e muito valorizado, porque foram os únicos que conseguiram apurar-se e fazer um brilhante resultado, mesmo sendo constantemente prejudicados pela equipa técnica. Eles e outros atletas que, embora sendo portugueses, optaram remar por outras selecções mostraram que os remadores nacionais também conseguem chegar onde os outros chegam. Precisam é de tempo, organização, apoio e, sobretudo, que os deixem remar.

12 comentários:

Anónimo disse...

Parabens pela entrevista!
Ao NdR. Ao Bruno e Roberto pela abertura. Espero que hajam olhos que leiam bem estas palavras e tomem finalmente medidas para vermos estes e outros remadores com motivacao para representarem Portugal. Este DTN ja demonstrou estar completamente a leste do remo. Infelizmente nao teve a coragem para se demitir e o assumir, nem o Presidente da FPR de o fazer.

Anónimo disse...

como jornalista és tendencioso nas questões que realizas.se tens formação,deves saber que as questões não devem ter só um sentido.Em momento algum questionaste se estes atletas se acham exemplo e cumpridores dos seus deveres.tens algum contrato com a oposição ou chegam as cervejas que te pagam.quando tiver oportunidade,falarei contigo pessoalmente.sai da mediocridade

JMR disse...

Só dois pontos: ainda espero respostas às perguntas que fiz no "sentido" da Federação; se os atletas não são "exemplo" nem deviam ter sido chamados à regata de apuramento.
Quanto à "mediocridade", cada qual tem preferências e não me compete julgar isso. De qualquer forma, o email do blogue está bem visível na parte superior, por isso não te falta "oportunidade".

Anónimo disse...

Dass.. isto é muito grave..

Anónimo disse...

o remo nos blogs é melhor que os gato fedorento na televisão. vocês é q são burros em deixar as coisas acontecerem. se ninguém for aos estágios, se nenhum clube deixar os seus atletas aprticiparem a federação tem de cair.

Anónimo disse...

Joao, nao devias aprovar comentarios anonimos de quem se esconde atras de um ecra para descarregar as suas frustracoes.
Ate acho que o "anonimo" tem alguma razao, faltaram essas perguntas, mas pelas palavras deles ja se sabe a resposta.
Nao concordo com a possibilidade de anonimos continuarem a comentar. Comentar no anonimato, isso sim, pode se chamar mediocridade.

JMR disse...

Ola Estêvão,
A verdade é que alguns dos anónimos têm feito comentários com relativo interesse. Por exemplo, foram anónimos que falaram pela primeira vez das multas pelo não uso do equipamento, mas finalmente houve agora atletas a assumir isso.
Por outro lado, tenho vários anos de noticiário de remo e de canoagem para não ter de provar nada a ninguém quanto ao meu valor enquanto jornalista, pelo que essas frustrações passam-me ao lado. Prefiro quem, como tu, me dá críticas construtivas, para o bem e para o mal. A ti, se quiseres, posso reenviar as perguntas que tenho feito à Federação e que continuam sem resposta, depois dirás se falta algo.
Vou pensar na tua sugestão. De qualquer forma, é possível moderar os comentários anónimos. Não rejeitei aquele porque, como te disse, nada tenho a provar quanto ao meu valor. Além disso, quem não gostar pode ir ler noticiário no Laststroke, pois não encontra em mais nenhum lado.
Por fim, agradecia que tu tentasses obter uma resposta oficial da Federação. Já que a mim se recusam a responder, pode ser que a ti o façam. Eu não tenho acesso (oficial) às circulares para ler as respostas oficiais.

Anónimo disse...

Realmente é uma boa entrevista e ainda bem que há pessoas para além do Pedro e Nuno a denunciar o que se faz aos atletas, só é pena que estes atletas não façam pressão junto dos clubes que os representão para nas proximas eleições em vez de tornarem a votar no Sr Rascão dêem oportunidades a outros de trabalhar. Portanto principalmente ao atleta do Caminhense pode começar por abrir os olhos ao seu clube que foi grande aliado da FPR que temos agora.

Anónimo disse...

A entrevista está muito interessante, embora possa contestar certos pormenores, que só quem vive a modalidade se apercebe. Eu não vejo a entrevista e/ou as questões como tendenciosas. Se por ventura passa pela cabeça de muita gente que os atletas não são dignos de estar na selecção, de quem será a culpa?! Dos atletas?! Pessoalmente acho que se deve seguir um raciocínio em cascata:
Se um atleta é fraco, existe uma solução muito simples: “Fora com ele, RUA”.
Se um atleta não cumpre com os treinos, existe uma solução muito simples: “Fora com ele, RUA”.
Se um atleta não se consegue motivar, e não assume a responsabilidade do treino de alta competição, existe uma solução muito simples: “Fora com ele, RUA”.
Na minha opinião pessoal, o sistema deveria funcionar assim, e se funcionasse assim… Como seria possível que a culpa ser dos atletas?! Quanto muito seria dos treinadores que acreditassem nesses atletas e apostassem neles. Se a escolha era mal feita, a culpa não podia ser do atleta que se limita a aceitar a convocatória e ir.
Se porventura se quisesse subir um bocadito na ‘escadaria da culpa’, então seria no sentido de que as más escolhas/opções do treinador seriam responsabilidade dele próprio, ou seja, nesse caso a culpa seria de quem mantivesse lá o(s)treinador(es). Numa fase ainda mais profunda poderia então incutir-se culpas a quem elege os órgãos administrativos e de gestão.
Claro está que também a entidade que distribui as verbas também poderia ter a sua fatia de culpa. Mas essas entidades têm que repartir as verbas disponíveis por diferentes modalidades, ou seja, faria a sua própria aposta nas modalidades que entende ter projectos mais coesos e credíveis, se essas verbas são distribuídas para esses projectos, e os projectos não tivessem sido concretizados (ou não tivessem sucesso) a culpa seria de quem entrega o dinheiro?!
Os atletas têm a culpa dos maus resultados, pudera, são eles que lá estão, e é fácil dizer que um atleta faltou (ou não cumpriu) a 10 ou 15 treinos, e que é por isso que não tem sucesso, mas uma época tem cerca de 500 treinos, se calhar os treinos que o atleta cumpre também são relevantes para o resultado final. Na MINHA opinião um atleta deve ser culpado, mas não pode ser culpado duas vezes pelo mesmo erro.
Cumprimentos,
Paulo

Anónimo disse...

julio seixo!

Adorei a entervista !!
mas acho que a equipa tecnica (todos os elemntos sem excepção)e o nosso presidente rascão marques , que na minha opinião tem feito um bom trabalho , so pecando na escolha , dos seus tecnicos e na impunidade para com eles , mas acho que a metodologia deles é muito avançada , tão avançada que só eles entendem ,que é esta : os atletas é que estão errados nos é que tamos certos , mas acho que já atletas errados a mais , não acham ? e assim se perderam 4 anos em que o remo andou pra trás , e se não fosse a proeza do 2x ligeiro , coitados de nós , mas o que mais me revolta é que sei que o grupo que começou a tres anos atras se fosse trabalho com alguem no minimo coerente , e que tivesse algumas noçoes basicas de remo como afinçoes , técnica ....................e outras teriamos 3 barcos nos jogo , por isso meu colegas infelizmente estas entrevistas , não destapam a venda que teem rascão marques acerca dos seu treinadores ........pois afinal nos atletas é que estamos errados .......!!!!!!!!!!?????????um abraço a todos os atletas !!!!!!

Anónimo disse...

A diferença da relação estabelecida e permitida pelos nossos treinadores e dirigentes, da actual direcção e uma das maiores potências do remo mundial.

http://www.youtube.com/watch?v=NEOxyM1X8aI

Qualquer diferença de atitudes é pura coincidência.

Gu disse...

De muito relevo esta entrevista!!! axo que refere os grandes pontos negativos desta federaçao que poucos ca fora conheciam!! parabens noticiasdorio, bruno e roberto!!! tendo tambem estado nos estagios da fpr desde 2005/2006 partilhei mts dos momentos aqui referidos!!